Gengivas e colesterol ruim
Um estudo, publicado no Journal of Periodontology, revela que a periodontite – inflamação nos tecidos moles em torno dos dentes que pode afetar gengivas, ossos e ligamentos – aumenta em até quatro vezes a possibilidade de os pacientes com a doença apresentarem níveis patológicos de triglicérides quando comparados a pacientes sem periodontite.
De acordo com o artigo, atualmente a doença periodontal tem sido associada a diversas patologias de natureza sistêmica, entre elas diabetes, doenças cardiovasculares, infecções pulmonares e partos de prematuros.
Trata-se de uma doença inflamatória e infecciosa produzida por bactérias gram-negativas presentes no biofilme dental que afetam o periodonto, isto é, os tecidos envolvidos na fixação do dente ao ossos. “Caracteriza-se por intensa infiltração inflamatória que causa perda progressiva da inserção conjuntiva e pode ocorrer em indivíduos saudáveis de qualquer idade”.
De acordo com Antônio Martins Figueiredo Neto, um dos autores do artigo, a pesquisa detectou uma forte correlação entre a doença periodontal e a aterosclerose. A doença aumenta a quantidade de lipoproteína de baixa densidade (LDL, na sigla em inglês), conhecida como “colesterol ruim”.
“Nossos resultados indicaram claramente que pacientes com periodontite crônica possuem altos níveis de LDL modificada, a grande vilã no desenvolvimento da aterosclerose, quando comparados com pacientes sãos. Após o tratamento periodontal, o nível de LDL modificada no plasma diminuiu”, disse Figueiredo Neto à Agência FAPESP.
Figueiredo Neto, que é professor titular do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), coordena dois projetos temáticos financiados pela FAPESP: “Fluidos complexos: cristais líquidos, coloides magnéticos e fluidos de interesse biológico e elastômeros” e “Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Fuidos Complexos (INCT-FCx)”, este último em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
“Em ambos os projetos temáticos o objeto de estudo são os fluidos complexos. Dentre eles destaco os cristais líquidos e os coloides magnéticos (ou ferrofluidos)”, disse.
O trabalho publicado, segundo o pesquisador, envolveu um esforço multidisciplinar com a participação de físicos, imunologistas, odontólogos e matemáticos de várias universidades como a USP, a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e a Universidade Estadual Paulista (Unesp).
“Não há dúvida de que em muitos problemas, em particular aqueles ligados à saúde e à ciência dos materiais, essa abordagem multidisciplinar é fundamental e propiciará saltos de qualidade até então não vislumbrados”, disse.
No Brasil, segundo ele, a pesquisa multidisciplinar no nível da que é desenvolvida no INCT-FCx ainda é muito incipiente. “Isso se explica parcialmente pela barreira existente entre os pesquisadores das diferentes ciências da natureza. Em muitos casos a linguagem e a abordagem dos problemas parecem ser muito diferentes. Entretanto, após vencer essa barreira notamos que há um ganho específico enorme para todos os pesquisadores envolvidos”, disse.
Nova técnica
Cerca de 40 pacientes com periodontite crônica participaram da pesquisa. Esses pacientes foram tratados e avaliados durante 12 meses. Para o estudo, os pesquisadores aplicaram uma nova técnica, a Varredura-Z, para a dosagem da quantidade de LDL modificada no plasma.
De acordo com Figueiredo Neto, a Varredura-Z é uma técnica de óptica não-linear. É comumente utilizada no estudo de materiais e o grupo de pesquisa a empregava para estudar propriedades de cristais líquidos e coloides magnéticos.
“Quando eu vi a estrutura de uma LDL notei que se assemelhava muito às micelas de cristais líquidos que estudávamos há mais de duas décadas. A partir daí veio a ideia de utilizar nossa técnica para investigar a assinatura não-linear da LDL e da LDL modificada. A surpresa veio quando verificamos que eram muito diferentes, possibilitando a sua identificação e quantificação”, explicou.
O cientista afirmou ainda que até hoje se utiliza apenas a quantidade de nível plasmático de LDL, sem detecção da quantidade de LDL modificada para avaliar o risco de desenvolvimento da aterosclerose.
“Apesar da sua má fama, a LDL é a lipoproteína mais abundante no plasma e a principal transportadora de colesterol para as células. É, portanto, essencial ao metabolismo celular”, disse.
De acordo com o estudo, os resultados mostraram que o nível plasmático da lipoproteína de alta densidade (HDL, na sigla em inglês), conhecida coloquialmente como “colesterol bom”, foi menor nos pacientes com periodontite.
E esses pacientes são portadores de um maior número de LDL modificadas quando comparados com os que não têm periodontite. Os resultados de Varredura-Z indicaram que a concentração de LDL modificada nos pacientes após o tratamento periodontal reduziu significativamente em comparação à dosagem determinada antes do tratamento.
Segundo o pesquisador, no momento o grupo investe em “várias frentes”. Estamos verificando a assinatura óptica não-linear de LDLs provenientes de diferentes indivíduos com diferentes fenótipos e grupos de risco. Por outro lado estamos pesquisando a origem dessa assinatura óptica do ponto de vista teórico. Essa compreensão ainda não está completa”, conta.
O artigo publicado no Journal of Periodontology sobre periodontite foi o primeiro. Mas o grupo já publicou outros trabalhos em revistas internacionais sobre o tema da LDL e a técnica de Varredura-Z.
Para ler o artigo Cardiovascular disease Parameters in Periodontitis, de Antonio Figueiredo Neto, disponível na biblioteca on-line SciELO (Bireme/FAPESP),
Olá Dra. Mirna, tudo bem?
ResponderExcluirAdorei uma aula sobre Gengiva saudável que a senhora postou na web!
Me ajudou muito!
Grata,
Jennifer